Por Jonathan Mazon
O ano vem chegando ao fim, e a terceira temporada de balanços poderia significar, em pelo menos duas grandes companhias de capital aberto, que 2021 foi, afinal, um ano ruim. Magalu e Via, por exemplo, apresentaram seus balanços do terceiro trimestre do ano e, impactadas pela retração do consumo – consequência da alta da inflação, dos juros, dos custos de matérias-primas, entre outros fatores econômicos, passam por aquilo que não deveria ser tratado como evento extraordinário, mas sim como um acontecimento cíclico natural: Um resultado aquém do esperado em um balanço trimestral.
Magazine Luiza apresentou este trimestre queda de 30% em seu lucro líquido em comparação com o mesmo período em 2020. Na mesma base de comparação, o Ebitda da varejista caiu 75%. Os fatores levaram à desvalorização de 14,21% das ações da empresa. Já a Via, que elevou sua provisão para despesas trabalhistas em R$ 1 bilhão, viu seu prejuízo líquido chegar a R$ 638 milhões – no ano anterior, no mesmo período, seu lucro líquido foi de R$ 590 milhões.
E o que as duas histórias recentes acima nos contam com relação a governança e transparência? De forma bastante clara, a lembrança de que o anormal seria termos negócios que funcionam como planilhas eletrônicas, cumprindo à risca todas as metas divulgadas ao mercado, trimestre após trimestre, ano após ano.
Governança é justamente o fator que torna possível para os negócios endereçar os seus impasses com transparência, assertividade e integridade. Afinal, nada pior do que problemas acumulados debaixo dos “tapetes corporativos”. Mais cedo ou mais tarde, eles sempre vêm à tona.
De tempos em tempos, temos algum escândalo corporativo a estampar as manchetes pelo mundo a fora e a nos lembrar que, como tantas outras coisas, os negócios também estão expostos a riscos de diversas naturezas.
Voltando aos nossos dois exemplos acima, independentemente do talento e dedicação dos seus gestores, nem sempre é possível mitigar por completo a materialização de riscos como os impactos de crises sanitárias e econômicas ou do aumento extraordinário de passivos trabalhistas. Nesses casos, sempre haverá um momento seguinte em que os negócios precisarão lidar com esses desafios e seus desdobramentos e nada melhor que a transparência com relação ao que pode ser esperado da administração.
É longa a lista de negócios que, por seu foco exacerbado em resultados, perderam de vista a ética e a integridade, componentes críticos à boa governança. Para ficarmos com um exemplo local e ainda vivo na memória do público, temos o caso do IRB [https://www.euqueroinvestir.com/irbr3-irb-cautela/] que nos mostra o que uma cultura obsessiva por números pode causar.
Em seu livro “The Seven Signs Of Ethical Collapse: How to Spot Moral Meltdowns in Companies… Before It’s Too Late” (Os sete sinais do colapso ético: como detectar os colapsos morais nas empresas… antes que seja tarde demais), Marianne M. Jennings, professora de direito e ética para os negócios norte-americana, traz já no primeiro “mandamento” um aviso importante: A pressão para manter resultados, ou seja, atingir metas agressivas a qualquer custo, certamente será um perigo no longo prazo.
Nesse sentido, algumas lições de ética e integridade nos negócios que Marianne Jennings coloca em seu livro, deveriam entrar em definitivo para a cartilha de ações de empresas. Consultar e seguir esses passos evitará que, com a preocupação de atender a ânsia de investidores, empresas coloquem suas reputações em risco.
Antídoto nº 1:Cultura e resultados guiados por valores
Evidente que resultados são parte intrínseca ao objetivo dos negócios e devem ser buscados a curto e a longo prazo, mas nunca à custa da ética e da integridade. Visto que nem tudo permitido por lei é necessariamente ético, será importante instruir e relembrar Administradores e colaboradores (sem distinção entre eles e de forma contínua) a diferença entre legalidade e princípios morais. Como cada segmento do mercado lida com questões de ofício e práticas específicas, a discussão e possíveis resoluções serão estipuladas pela cultura de cada organização.
Antídoto nº 2:Demita quem desrespeitar as regras
Certamente gestores são confrontados diversas vezes com a escolha de reconhecer ou não um resultado desfavorável. No entanto podemos observar casos em que houve um hiper foco apenas em resultados de curto prazo comprometendo a ética e integridade, acarretando falhas de governança e a impunidade dos gestores idealizadores e catalizadores de tais feitos. Nestes casos não é imprescindível uma grave crise de reputação global para comprovar que, no longo prazo, a falta de consequências para o desrespeito às regras leva ao colapso ético da organização. Temos no Brasil uma icônica petrolífera a provar o esforço que demanda a reversão de uma grave crise dessa natureza.
Antídoto nº 3:Exemplos devem vir de cima
Após diversos ciclos de escândalos corporativos observamos a movimentação legislativa cada vez mais, e de formas mais assertivas, exigir que os principais executivos dos negócios se declarem cientes do conteúdo das divulgações realizadas, bem como responsáveis pela veracidade das informações divulgadas. Com motivações similares, reparamos em normas que determinam a criação de órgãos de suporte às administrações de negócios, como Comitês de Auditoria para monitoramento e prevenção, assim indicando eventuais pontos de aprimoramento em suas estruturas de governança.
A expressão estrangeira “tone at the top” ilustra exatamente o conceito por trás destas propostas mencionadas. De nada adianta ter valores, políticas e procedimentos bem escritos se não há exemplos concretos que vem daqueles com maior visibilidade dentro das organizações. As posturas e atitudes dos líderes no dia-a-dia são valiosas e frequentemente os dirigentes não se atentam à interpretação errada de seus colaboradores. Nunca é demais comunicar e demonstrar com clareza os objetivos e os valores da organização e enfatizar que os resultados virão do trabalho e da estratégia, não da manipulação de informações ou qualquer outra ação antiética.
Antídoto nº 4:Pausas para reflexão
Por fim, vale realçar que para qualquer negócio é interessante manter o dinamismo e realizar avaliações constantes sobre o funcionamento e as premissas que guiam as atividades empresariais. Grandes técnicos e jogadores não hesitam em parar a bola e chamar o time para uma conversa de alinhamento durante o jogo quando necessário. Temos exemplos marcantes na história do nosso futebol. E na nossa história empresarial?
Embora o mercado possa sempre se assustar com uma notícia negativa e inesperada de uma companhia, os dados de longo prazo indicam que a transparência com relação a esses resultados sempre será melhor para a credibilidade [https://hbr.org/2020/03/dont-hide-bad-news-in-times-of-crisis] e provavelmente para o valor de mercado também [https://www.investopedia.com/articles/fundamental/03/121703.asp].
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